Assim um hagiógrafo apresenta este grande santo: “Eis aqui um homem admirável que Deus fez nascer depois da metade do século XII para ser por si só e por seus religiosos a luz do mundo, a coluna da Igreja, o sustentáculo da religião cristã, o reformador dos costumes, o flagelo dos hereges, a ruína da idolatria e de todas as seitas de infiéis, e o muro de aço que a Santa Sé apostólica sempre opôs a todos seus inimigos” (Père Giry, Vies des Saints, Bloud et Barral, Libraires-Éditeurs, 1882, tomo IX, p. 273).
São Domingos de Gusmão nasceu em Caleruega, em Castela a Velha, em 24 de junho de 1170. Seus pais, de ilustre nascimento, foram Félix de Gusmão e Joana de Aza, dignos chefes de uma família de Santos. Além de Domingos, o casal teve mais dois filhos que morreram em odor de santidade. O primeiro foi Antônio de Gusmão, sacerdote que, distribuindo todos seus bens aos pobres, retirou-se para um hospital para servir Nosso Senhor Jesus Cristo em seus membros sofredores. O segundo foi Manes, que entrou depois para a Ordem Dominicana, sendo grande pregador e exemplar religioso. Foi beatificado por Gregório XVI, juntamente com sua mãe Joana de Aza. Não se admira que numa família assim o menino se sentisse atraído para a virtude desde o berço.
Diz-se que, quando pequeno, Domingos, era tão sério e maduro, que parecia já dotado da sabedoria dos anciãos. Ele foi sempre modesto, recolhido, humilde, devoto, temperante e obediente.
Aos sete anos foi aprender as primeiras letras com seu tio, que era vigário em Gumiel d’Yzan, indo depois aos catorze para a universidade de Castela, em Palência. Durante dez anos Domingos brilhou nos bancos escolares, dando ao mesmo tempo o exemplo de sua virtude.
Nessa época o bispo de Osma, tendo conseguido reformar sua igreja, induziu os cônegos da catedral a viverem em comunidade, observando a regra de Santo Agostinho.
Depois de ordenado, Domingos foi um deles, sendo então nomeado vice-prior dos cônegos, o mais alto posto da comunidade, visto que o bispo acumulava também o de prior. O santo passou nove anos de uma vida de contemplação e de união com Deus como cônego regular, dificilmente ultrapassando os limites da casa canonical.
Entretanto, ele estremecia ao saber que tanta gente se perdia por falta de pregadores, e implorava a Nosso Senhor Jesus Cristo que lhe proporcionasse um meio de se consagrar por inteiro à salvação das almas.
Ocorreu então que, no ano 1203, o rei de Castela Afonso VIII pediu ao novo bispo de Osma, D. Diego de Acevedo, que fosse à corte da Dinamarca negociar o casamento de um de seus filhos com uma princesa daquela terra, cuja formosura tinha sido celebrada na corte pelos trovadores. O bispo levou consigo o Pe. Domingos de Gusmão.
No caminho tinham que atravessar os Pirineus, e entrar pelo sul da França. Passaram assim por Toulouse, que era a capital dos hereges cátaros, uma seita maniqueísta que estava fazendo muitos prosélitos, entre os quais os próprios Condes de Toulouse. A vista dessa região devastada pela heresia impressionou sensivelmente os dois viajantes. Como diz um dos biógrafos de Domingos, ele sentia o cheiro dos inimigos da fé como Santa Catarina de Siena o dos pecadores.
Foi aí que Domingos se convenceu ainda mais da necessidade de uma congregação de pregadores apostólicos para se opor às heresias.
No seu retorno da Dinamarca, os dois homens de Deus passaram pela Alemanha, e viram como seu povo bárbaro vivia à míngua por falta de quem lhes pregasse a fé. Foram então a Roma pedir ao Sumo Pontífice, para o bispo a resignação do episcopado, e para ambos, permissão para ir evangelizar aqueles povos bárbaros da Alemanha.
Mas Inocêncio III julgava muito mais importante para a Igreja, no momento, combater a seita dos cátaros, que arrancava muito de seus filhos, e não aceitou a resignação do bispo. Apenas permitiu-lhe que se ausentasse de sua diocese por dois anos, para se dedicar, com Domingos, à conversão dos cátaros.
Quando o bispo, expirado o tempo que o Papa lhe dera, teve que voltar à sua diocese, Domingos ficou só combatendo os hereges. Muitos milagres marcaram então sua evangelização entre os cátaros.
Estando em 1207 em Prouille, Domingos, preocupado com a sorte de várias donzelas que os pais não podiam sustentar por causa da carestia que assolava a região, reuniu-as no primeiro mosteiro dominicano, da Ordem Segunda, ou seja, das monjas.
Narram alguns dos biógrafos do Santo que foi na capela desse convento que Nossa Senhora lhe apareceu um dia e lhe disse que “como a Saudação angélica tinha sido o princípio da redenção do mundo, era necessário também que essa Saudação fosse o princípio da conversão dos hereges; que assim, pregando o Rosário que contém cento e cinqüenta Ave Marias, ele veria um sucesso maravilhoso em seus trabalhos e os mais empedernidos sectários se converterem aos milhares”.
O santo passou então a pregar a devoção a essa “coroinha de cento e cinquenta Ave-Marias”, incipiente início que resultaria depois no santo rosário da Santíssima Virgem Maria como hoje conhecemos.
São Domingos tinha quarenta e cinco anos de idade em 1215 quando reuniu os seis primeiros discípulos em uma casa de Toulouse, e lhes deu o hábito branco com a capa e capuz de lã negra como o dos Cônegos regulares de Osma, que ele seguia vestindo. Entre estes seis primeiros estava seu irmão o Beato Manes. Eles deviam formar um corpo de homens sábios, pobres e austeros, sendo que a ciência e a piedade deveriam ser os traços essenciais desses cavaleiros de Cristo. O trabalho manual ficava suprimido, a oração litúrgica diminuída, e os exercícios de penitência subordinados em favor do estudo prolongado, para atender às exigências da pregação. Não é de admirar que essa Ordem de intelectuais atraísse depois dois dos maiores luminares da Igreja e da Cristandade, Santo Alberto Magno, chamado pelos seus contemporâneos de “Doutor Universal” pela amplidão de seus conhecimentos, e o universalmente famoso “Doutor Angélico”, São Tomás de Aquino.
Inocêncio III deu sua primeira aprovação à Ordem nascente em 1215, e propôs no Concílio de Latrão a todas as igrejas, seu programa de renovação cristã e vida apostólica. Seu sucessor, Honório III, foi protetor e amigo de Domingos e de seus discípulos
Numa das idas de Domingos a Roma, encontrou-se providencialmente com Francisco de Assis, que para lá tinha ido para obter a aprovação de sua obra, e Santo Ângelo de Jerusalém, a quem o Poverello previu o martírio. Sem se conhecerem anteriormente, eles se dirigiram uns aos outros e abraçaram-se, enquanto dizia Domingos: “Somos companheiros e criados de um mesmo Senhor; os mesmos negócios tratamos; os mesmos são nossos intentos; caminhemos a uma e não haverá força infernal que nos desbarate”.
São Domingos de Gusmão faleceu aos cinqüenta e um anos de idade, em 1221, e foi canonizado por Gregório IX em 1234.
Dele diz o Martirológio Romano no dia 6: “Em Bolonha, o natalício [para o céu] de São Domingos, confessor, fundador da Ordem dos Pregadores. Celebérrimo pela santidade e doutrina, guardou sempre ilibada virgindade; por singular virtude de seus méritos, ressuscitou três mortos. Depois de haver, com sua pregação, reprimido as heresias e formado muitos na vida de religião e piedade, descansou em paz”.
São Domingos foi canonizado em 1234 pelo papa Gregório IX.