Um hagiógrafo, Pe. Paul Guérin (Vies des Saints, tomo X, p. 192), diz deste santo: “Cabe a este insigne varão e valoroso príncipe a glória de ter logrado ser Santo em meio dos esplendores da corte, na família, à cabeça dos exércitos, e entre os múltiplos cuidados inerentes ao bom governo de um grande e poderoso reino. (…) Pérola dos soberanos, glória da coroa da França, modelo de todos os príncipes cristãos e, para dizer em apenas três palavras, um monarca verdadeiramente segundo o coração de Deus, segundo o coração da Igreja, e segundo o coração do povo”.
São Luís de França nasceu no dia 25 de abril de 1215, filho de Luís VIII e Branca de Castela, neta, filha, esposa, irmã e mãe de reis. Mulher ativa e enérgica, rainha severa e justa, Branca tudo queria fazer por suas mãos, e nada parecia difícil quando se tratava de manter a majestade da coroa de seu filho primogênito.
Por isso, a prudente rainha cercou este filho dos mais idôneos tutores, procurando imprimir nele o ódio ao pecado e o amor à virtude. Dizia-lhe constantemente: “Meu filho, eu preferiria mais ver-te no túmulo, que manchado por um só pecado mortal”.
Luís subiu ao trono com apenas 12 anos, sob a tutela de Branca. Durante sua minoridade, a enérgica rainha reprimiu diversas guerras intestinas, governando o reino com sabedoria e justiça.
Tomando sobre si as rédeas do governo aos vinte anos, Luís se casou com Margarida, filha mais velha de Raimundo Berenger, conde da Provença. A nova rainha tinha as mesmas inclinações que seu esposo para a piedade e para o socorro dos pobres e infelizes. Muito discreta, Margarida jamais se imiscuía nos negócios do marido, a não ser quando chamada. Seguiu o rei por toda parte, mesmo além-mar. Matrimônio feliz que frutificou com 11 filhos, seis varões e cinco mulheres que, exceto a primeira, tornaram-se todas rainhas.
Governando bem sua casa, Luís IX era ainda mais admirável no governo de seu Estado. Jamais se viu tanta paz e prosperidade na França que durante seu longo reinado de 36 anos.
Para o bom governo do reino, o monarca santo cercava-se de eminentes teólogos como São Tomás de Aquino, São Boaventura, Guido Foucaud e Simão de Brion, estes dois últimos depois eleitos papas, Clemente IV e Martinho IV. Era também seu conselheiro o insigne teólogo, Roberto Sorbon, que instituiu em Paris o famoso colégio da Sorbonne.
Todas as outras nações, no Oriente e no Ocidente, do sul ao norte, estavam com problemas; mas os franceses, sob seu governo, gozavam de uma feliz tranqüilidade, que lhes era dada por sua sabedoria. Ele baniu de seus Estados a blasfêmia e os juramentos ímpios e execratórios, proibiu os duelos, os jogos de azar, a freqüência aos lugares de deboche, o luxo excessivo das mulheres, e as chicanas nos processos.
Tal era seu espírito de justiça e desinteresse, que o rei da Inglaterra foi, em 1264, com os grandes de seu reino, a Amiens para que o santo resolvesse seus pleitos. São Luís foi também árbitro nas desavenças entre o duque de Bretanha e o rei da Navarra. Mais tarde, quando na Cruzada, até os emires muçulmanos vinham lhe pedir conselho e apresentar suas pendências.
São Luís IX resolveu partir em cruzada para a Terra Santa no fim do ano de 1244, após séria doença. Não se sabe o que se passou no dia inteiro em que ele esteve como morto. O fato é que, quando se recuperou, julgou-se obrigado, como por um sagrado juramento, a se dedicar à essa empresa.
Os príncipes, irmãos do rei, Roberto, conde d’Artois; Afonso, conde de Poitiers; e Carlos, conde de Anjou, com suas esposas, bem como os maiores senhores do reino, receberam a Cruz com o monarca. Sua esposa Margarida, e os filhos pequenos, quiseram também acompanhá-lo.
Os cruzados lograram alcançar grande vitória em Mansurah, em 1250. Joinville, senescal da Champagne (oficial real encarregado da aplicação da justiça e do controle da administração nas províncias do sul do país), entusiasmado com a figura do rei durante essa batalha, afirmou: “Vi chegar o rei à frente da cavalaria. Sua cabeça sobressaia acima dos ombros de todos. Levava um capacete dourado, brandia uma espada da Alemanha: suas armas deslumbravam os olhos, e seu porte majestoso alentava os guerreiros. Asseguro-vos que jamais vi cavaleiro tão formoso”. Com seus possantes braços, o rei dava tantos golpes de espada e de massa, que derrubava todos os inimigos que dele se aproximavam.
Entretanto, a prosperidade inicial levou o exército a baixar a guarda, entregando-se ao divertimento, às festas, e a procurar os prazeres da terra. Isso atraiu a cólera de Deus, que mandou uma epidemia que obrigou os vencedores a retroceder.
Acontece que essa retirada foi muito desastrosa para os cristãos pois, adoentados, viram-se envoltos totalmente por seus inimigos. O único meio de livrar-se da morte foi se rendendo.
O rei, diz o Pe. Giry, “enfermo, e só com um criado para atendê-lo em tão angustiosa situação, nunca dirigiu uma súplica a seus inimigos, nem sua altivez se humilhou à linguagem da submissão e do medo. (…) Os infiéis estavam assombrados vendo tanta resignação, e diziam entre si que abandonariam sua fé se algum dia o profeta os deixasse expostos a tantas calamidades”.
São Luís declarou que se renderia com todo seu exército contanto que lhes deixassem a vida. Prometeu pagar um milhão de pesos de ouro pela vida dos seus soldados e, pelo seu resgate, ofereceu devolver aos infiéis a cidade de Damieta, que conquistara. O que foi aceito pelos mouros.
Outra vez na França para jubilo geral, o Santo tinha entretanto sempre presente o que se passava no Oriente, e a opressão na qual tinha deixado seus cavaleiros. Estes lhe imploravam constantemente que fosse em seu auxílio. O que determinou o valoroso rei a empreender uma segunda cruzada. Sua mulher e três filhos foram outra vez com ele.
Os cruzados atacaram as forças maometanas no norte da África. Mas o sultão se defendeu com unhas e dentes, de modo que os cristãos lograram conquistar apenas um terreno próximo das ruínas de Cartago. De lá assaltaram a capital, fortemente defendida. Querendo rendê-la pela fome, cercaram-na, impedindo a chegada de víveres.
Entretanto, também eles foram vítimas da escassez de alimentos, e o pior é que nova peste, provocada pelos cadáveres em corrupção, seguida de uma disenteria violenta, pôs o exército fora de combate. O legado do Papa sucumbiu, assim como um dos filhos do rei. Ele próprio foi atacado por uma febre contínua, com fluxo de sangue.
Logo a trágica notícia abalou todo o acampamento: “O rei está morrendo!”. São Luís chamou então para junto de si os principais oficiais de seu exército, e os exortou a se comportarem como verdadeiros servidores de Jesus Cristo: “Pois, uma vez que sois seus soldados não somente pelo Batismo, mas também pela cruz que tomastes com tanta generosidade, não vivais como seus inimigos, não lhe façais guerra por vossa impiedade, avareza, gula e impudicícia; uma vez que vós sustentais seu Nome pela força de vossas armas, não sejais maometanos por vossos modos, tendo feito uma profissão tão autêntica de serdes cristãos, expondo vossas vidas por sua Igreja”.
As palavras que deixou a seu filho que o deveria suceder, – e que infelizmente o espaço não nos permite citar – são um portento de sabedoria e santidade.
O heróico e santo rei rendeu a Deus sua ilibada alma no dia 25 de agosto de 1270, aos 56 anos de idade.
O Martirológio Romano Monástico diz dele neste dia: “No ano do Senhor de 1270, o nascimento para o céu de São Luís, rei da França. Sua sólida formação humana e cristã, bem como seu senso de justiça, permitiram a expansão e o alto nível moral e cultural da França e da Cristandade no século XIII. Seu corpo foi trazido de Túnis para Paris, e inumado na necrópole real de Saint-Denis, ao passo que seu crânio foi depositado na Sainte Chapelle, em Paris, construída por ele para conservar a coroa de espinhos do Salvador”.